Artigo da CNM trata sobre a crise fiscal e os Municípios

Notícias AMVAP

Artigo assinado pelo presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, foi publicado pelo jornal Diário Comércio Indústria e Serviços (DCI) de São Paulo nesta sexta-feira, 7 de outubro. O texto A crise fiscal e os Municípios sinaliza que as contas públicas brasileiras enfrentam uma crise sem precedentes e que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241/2016, que trata de limites para os gastos públicos pelos próximos 20 anos, não é a medida mais ideal para o cenário de recessão enfrentado nos governos locais. Leia o texto na íntegra abaixo.

Sem corrigir distorções, o ajuste penaliza os mais pobres e as prefeituras

– As contas públicas brasileiras enfrentam uma crise sem precedentes. Temos uma combinação explosiva entre juros elevadíssimos, que custam ao erário cerca de 8% do PIB ao ano, e déficits no orçamento de todos os governos, provocados por uma despesa rígida e uma receita que desaba a cada mês por conta da depressão econômica.

Essa crise não surgiu agora, como podemos observar pelo ritmo de crescimento elevado dos gastos públicos, que supera os 4% acima da inflação desde 1997. Mas o aumento da carga tributária no passado e a bonança econômica que vigorou entre 2004 e 2008 deram aos governantes a sensação de que essa trajetória seria sustentável.

A realidade se revelou muito mais dura do que qualquer um poderia imaginar e vamos terminar o ano de 2016 com nosso PIB 8% menor do que há dois anos. Isso representa uma perda de receita da ordem de R$ 200 bilhões, número esse que não afeta apenas as estatísticas que o mercado financeiro tanto observa, mas a vida dos cidadãos, sobretudo os mais pobres, aqueles que mais dependem dos serviços públicos, como a saúde e a educação, que no Brasil são sustentadas pelos municípios.

10-10-crise-fiscal

Diferentemente de alguns governadores, que podem recorrer a depósitos judiciais e a recursos de empresas estatais para pagar as contas, a vida dos prefeitos – principalmente nas menores cidades, aquelas que mais são afetadas pela queda nas transferências de impostos da União – é muito mais dura. E poderá ficar ainda mais dura a depender das medidas que o governo federal adotar para enfrentar a crise.

Não temos dúvida de que algo precisa ser feito para controlar o crescimento do gasto público, mas fazer isso durante uma recessão econômica é algo muito delicado e não se faz por decreto. Por exemplo, a ideia de impor um teto para as despesas que congele em valor real o custeio da saúde e da educação não tem como funcionar na prática, a não ser transferindo o ônus para os municípios, responsáveis por esses serviços.

Uma emenda constitucional dizendo que o gasto não pode crescer mais do que a inflação não é capaz de conter por si só os custos e a demanda por serviços públicos de saúde e educação no país. A única consequência prática de uma medida como essa é agravar o subfinanciamento federal à saúde e educação públicas.

Isso não significa que os custos não devam ser reduzidos, o que depende de o Congresso revisar decisões que tomou nos últimos anos para aumentar o gasto que agora quer limitar. Mas a redução de custos é uma parte da equação. A outra parte tem a ver com a demanda por serviços públicos, que é maior do que a oferta que os municípios têm condições de atender.

Então, o ajuste fiscal inteligente não é aquele que simplesmente cria um teto artificial que inviabiliza as administrações municipais e reduz o investimento público a zero. O ajuste inteligente é aquele que se baseia em medidas concretas e reformas que garantam a redução dos custos, sem tentar restringir a oferta já precária de serviços públicos.

Além disso, o ajuste fiscal não pode deixar de enfrentar algumas distorções muito gritantes que temos em nosso sistema de tributação, como é o caso de um amplo leque de isenções que caracterizam o imposto de renda e o IPI, bases do fundo de participação dos municípios. Não querer corrigir essas distorções revela a preferência por um ajuste que só penaliza os mais pobres e os municípios.

Paulo Ziulkoski